segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Depoimento da homenageada de 2010 - Jurema Werneck


Quando realizamos eventos com as(os) nossas(os) personalidades negras, não imaginamos o que realmente passa nas cabeças delas(es).Mas dessa vez, tivemos a honra de saber da Dra Jurema Werneck que foi uma das homenageadas do Prêmio Comdedine de Pesquisa escolar de 2010, o que ela sentiu.
Este é o texto que ela enviou para suas companheiras da ONG Criola e alguns de seus familiares.
Compartilhamos com você, delicie-se.

Pois é.

Apesar da cara de dia comum, 17 de novembro...Nenhuma efeméride, nada... acabou virando um dia especial. Era o dia de entrega do Prêmio COMDEDINE de Pesquisa Escolar. Explico: é uma premiação que acontece há 17 anos, para alunos da rede municipal de ensino do Rio de Janeiro (todas as séries), de 1064 escolas.

Esta premiação é dada a trabalhos de pesquisa escolar sobre temas ligados à população negra no Brasil - geralmente personalidades das diferentes datas da história de luta de afrodescendentes. É organizada pelo Conselho Municipal de Defesa dos Direitos do Negro - COMDEDINE e, neste ano, também pela Secretaria Municipal de Educação.

Na edição de 2010 o tema foi saúde e suas personalidades - com a inovação de, além de se voltar para recuperar a memória de quem já morreu, passaram a incluir também pessoas vivas. E foi assim que eu entrei nisto. Escolheram 03 nomes para serem objeto de pesquisa e produção de trabalhos pel@s alun@s: Juliano Moreira, psiquiatra; Sebastião José de Oliveira, entomologista. E eu!!!!

Achei bacana....Visitei escolas, conversei com alun@s e professoras. Contei um pouco da minha vida. Respondi a perguntas. E tirei milhões de fotos!!!!

Mas não esperava a emoção de hoje, data de entrega de prêmios: livros, bicicleta, computador, diplomas, etcs, para @s autor@s dos trabalhos premiad@s: cerca de 12 alun@s e respectiv@s
professor@s...Eram crianças e adolescentes de 7 a 15 anos (aparentemente) que produziram redações, maquetes, poesias. Brincalhões, ruidos@s, sorridentes. Contentes!!!!

Quando cheguei, a menina negra de cerca de 10 anos, do bairro de Tubiacanga, na Ilha do Governador, me foi apresentada e tirou fotos comigo: seu trabalho foi uma poesia de cordel contando minha vida. A professora, orgulhosa, só falava da riqueza do trabalho da menina e ela, tímida, sorria olhando ora para baixo, ora para mim. Depois fui apresentada a um grupo (2 meninas e 1 menino) de uma escola de Copacabana. Tiraram menção honrosa (uma delas me explicou que o regulamento exigia desclassificação del@s, por que pedia trabalhos individuais). Mas o juri optou por premiá-los assim mesmo - e á professora afetuosa e orgulhosa. Fizeram uma poesia que recitaram para mim.

Tubiacanga e Copacabana, coincidentemente, são lugares da minha vida. Nasci em Copacabana (Morro dos Cabritos) e vivi parte da infância e adolescência na Ilha, frequentando muito a praia de Tubiacanga, aldeia de pescadores, com minha família...

Na hora da entrega do prêmios, não pensei que me emocionaria tanto ao som do hino nacional...Mas aconteceu que, de lá do palco onde eu estava junto com representações de autoridades e ao lado da filha do Professor Sebastião; de lá dava pra ver o rosto de menininhas negras magrinhas e sorridentes, do menininho negro que é a cara do meu irmão mais novo, que cantavam o hino, tão pequenininh@s e já tendo seu talento reconhecido; já sendo acolhidas num mundo que em outros momentos lhes diria (dirá?) não...Magrinhas como eu fui, formiguinhas (como Seu Rubens, um negro enoooorrrrme lá do Morro dos Cabritos, e chamava quando me via e me punha no colo pra ver de perto seu sorriso e seu vozeirão....

Também não pensei que me lembraria tão intensamente de minha mãe e de meu pai, falecidos antes do tempo, mas que deixaram uma herança tão forte, tão preciosa, que me obriga (e a meus irmãos) a passá-la adiante. Lembrei de seus tantos sacrifícios por nós. Entendi que aquele momento os reverenciava....

Fiquei envaidecida. Fique emocionada. Não tanto pelos elogios, delicadezas e sorrisos que recebi. Mas por saber que aquelas crianças contavam comigo para atestar o quanto elas são e serão importantes. Também por saber que, mais do que curar as feridas das menininhas e menininhos que fomos nas escolas do passado, tantas vezes brutalizad@s pelo racismo entre nós, aquelas crianças nos ofereciam a chance de sermos antídoto, vacina, escudo, ombro...Elas contam conosco!!!

Por isso partilho esta emoção com vocês. Para que saibam que as crianças receberam suas mensagens (suas vidas) de luta e coragem.

E eu também.

Um abraço,

Jurema

Bem, depois disso, só temos que agradecer mais uma vez a sensibilidade de nossa Dra Jurema Werneck pelo seu lindo depoimento, e dizer que o trabalho de voluntárias(os)do conselho do COMDEDINE, VALE MUITO A PENA!!! OBRIGADA(O)!

2 comentários:

  1. Lindíssimo o texto! PARABÉNS AO COMDEDINE! PARABÉNS, JUREMA! abs Roberto Borges

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  2. Tenho que recorrer as palavras de Beto Borges,e acrescentar que o fortalecimento da cidadania vem do incentivo a informação que aponta os direitos e deveres de cada um de nós.
    Parabéns Dra Jurema Werneck

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